Fabricação de queijos

Fiz mistério durante esta semana, falando que ia fazer um post diferente. E vou fazer mesmo, por pura inspiração: quero escrever sobre queijos. Mas não sobre harmonização de queijos e cervejas, algo que garanto que vários cervejeiros tem mais conhecimento que eu para isso. Quero escrever sobre a possibilidade, acho que pouco remota, de fazer seu próprio queijo em casa. Essa inspiração surgiu a muito tempo, em uma conversa com o Murilo (DUM cervejaria), além da curiosidade em cultivar fermentos.

Vou utilizar alguns materiais para escrever este texto, entre anotações da Priscilla, minha esposa, que é Mestre e Bioquímica de alimentos, um ótimo material que ela achou de Márcia Gonçalves Dias, disponível no Scribd, um bom texto em inglês sobre tipos de produtos de leite, do Nordic Recipe Archive, além do TCC da Fernanda de Morais Cavalcante – todos referenciados no final do material.

Uma definição de queijo é : queijo é um concentrado protéico-gorduroso, resultante da coagulação do leite, seguida da dessora do coagulo para decréscimo da umidade.

É importante também delimitar os seguintes componentes do queijo:

  • A proteína é o componente mais importante do queijo.
  • A gordura varia de acordo com o tipo de queijo.
  • O teor de umidade também varia muito e é correlacionado com o tempo de conservação do queijo.

Para elaborar o quejio é necessário alguns materiais:

  • Leite: leite UHT não serve, pois a temperatura desnatura as proteínas do leite, dificultando o coágulo das proteíncas. É melhor utilizar leite pasteurizado homogeneizado, em saquinhos, ou arrumar um leite in natura na sua região;
  • Coalho: responsável por aglutinar as proteínas do leite. Pode ser enzimático, como o que é encontrado em supermercados, ou então ácido, como o utilizado para a fabricação de ricotas.
  • Materiais de trabalho: utiliza-se alguns instrumentos como lira (para mexer o coalho, deixando os granulos mais homogênios), termômetro alimentício, etc.Forma de queijo
  • Formas de queijos: para deixar o seu queijo com cara de queijo mesmo, além de ajudar na prensa – dos tipos de queijos que exigem isso. Mais importante que um material bonitinho, é possibilitar a retirada do soro do queijo.

Desta forma, é possível classificar os queijos em 4 principais classes:

  • Macio: Umidade acima de 50%
  • Firme ou semiduro: Umidade de 40 – 50 %
  • Duro: Umidade de 37 – 40%
  • Muito duro: Umidade abaixo de 37%

Segundo o tipo de cozimento os queijos também são caracterizados como:

Tratamento da Massa Característica da Cura
Consistência (grupos)
Exemplos
Massa Crua Sem cura
Cura por bactéria
Cura por mofo
Minas frescal
Minas meia-cura
Gorgonzola, camembret
Massa semicoziada Cura rápida (1–2 meses)
Cura prolongada
(3 meses ou mais)
Prato, Gouda
Cheddar
Massa cozida Sem olhadura
Com olhadura
Parmesão
Suíço, Gruyére
Massa filada Sem cura
Curado
Mussarela
Provolone
Massa coagulação ácida Cremoso
Frescal
Curado
Requeijão
Cottage cheese
Queso blanco
Fundido Cremoso
Consistente
Requeijão
Queijo pasteurizado
Proteína do soro Frescal
Consistente
Ricota
Ricota curada

Fonte: Dias, Tecnologia de Fabricação de Queijos.

Mas, afinal de contas, como é que se faz queijo? De uma forma genérica, podemos elencar 8 principais passos:

1 Pasteurização do leite

Etapa muito importante, principalmente para queijos que não venham a curar (maturar). Queijos que curam mais de 2 meses acabam por matar a maior parte dos agentes patogênicos. Muito cuidado: temperaturas muito altas (acima de 72ºC) podem desnaturar as enzimas do seu leite. Assim, cuidado ao tentar pasteurizar o leite in natura que você conseguiu. Se for de boa procedência, eu faria um queijo de cura e não pasteurizaria.

2 Aquecimento do leite e adição do coalho

O leite é aquecido até 37ºC, sendo mexido frequentemente para homogeneizar o processo. Esta temperatura é ideal para a ação das enzimas do coalho, que causa a solidificação do leite pela precipitação da caseína, princicipal proteína do leite. Para que isso ocorra, ele é mantido nesta temperatura por 40 a 60 minutos. É também nesta etapa que são adicionadas as leveduras, quando presentes, nos queijos. Queijos finos possuem leveduras em sua composição.

3 Verificação da Coalhada

Para verificar se a massa coalhada está no ponto, cora-se ela ao meio: ela deslisará das laterais, e a faca utilizada sairá limpa.

4 Corte

Verificado o ponto da coalhada, são feitos corte, objetivando um grão de coalhada compatível com o queijo que se objetiva. Queijos mais macios necessitam de cortes entre 2 e 3cm, enquanto queijos como o gruyére necessitam de cortes de 1 cm.

5 Mexedura e Aquecimento

Agita-se levemente os grânulos, com o intuito de iniciar a separação entre soro e a coalhada, além de homogeneizar os grânulos formados. Após esta etapa, em queijos de massa semicozida e cozida, faz-se um novo aquecimento, entre 37ºC e 54ºC.

6 Dessoragem e enformagem

Nesta etapa, retira-se o soro separado da coalhada, objetivando dar formato ao queijo. Alguns queijos são pressionados após esta etapa, buscando um baixo índice de umidade. Para isso, utiliza-se em torno de 3 vezes seu peso para criar o efeito de prensagem. Queijos macios não exigem pressão depois da enformagem, justamente por possuírem maior índice de umidade. Existem formas disponíveis no mercado para este fim. Em queijos mais duros, é importante executar a viragem, por duas vezes, para maior retirada do soro: na primeira, permanece-se durante 20 mintuos; na segunda, por 1 hora.

7 Salga

Existem três tipos de salga: a salga pode ser feita diretamente na massa, antes de ser enformada; pode ser feita através da salga seca, onde é adicionada acima ou nas laterais do queijo já prensado, na proporção de 70 grs/kg de queijo; ou através de salmora, na proporção de 3 Litros de salmora com 20% de sal para cada kg de queijo.

8 Secagem e cura

Curagem de queijosOs queijos foram secos à temperatura de 5ºC durante 18 horas. A cura é feita à temperatura de 5ºC durante 10 dias, e após isso é curado em 12ºC com 85% de umidade relativa. O tempo de cura varia de acordo com o tipo de queijo: variam de 15 dias até 15 meses, como os melhores parmesãos.

Depois deste detalhamento de fases e etapas, vocês devem estar se perguntando ainda porque desta curiosidade, não? Mas a explicação já virá.

Mas afinal de contas, onde está a novidade?

Fiquei matutando porque eu não podia produzir queijos em casa, durante mais ou menos 1 mês. Fui atrás do que precisava adquirir, e encontrei fermentos para grandes produções – para 500 litros de leite, em média. Dessa forma, pensei em como fazemos para adquirir um fermento de uma cerveja disponível no mercado: retira-se parte da levedura, disponível na garrafa, e inocula-se ela em mosto estéril para que se reproduza e cresça. Então imaginei: porque não posso fazer o mesmo com queijos? E é exatamente isso que estou fazendo.

Comprei 3 amostras de: Gruyére, Gouda e Maasdam. Estou tentando multiplicar as leveduras ali disponíveis, e fazer a inoculação para produzir algumas peças destes queijos. Além disso, farei uma experiência: produzir alguns queijos com leveduras de cervejas, em conjunto, como nossos Saccharomyces cerevisiae eQueijo inoculado no leite Brettanomyces. Afinal de contas, produtos como o Kefir contém estas bactérias em sua composição! Estou verificando ainda como farei as adições, e o que esperar desse tipo de adição.

Falando em Identidade Nacional, que tal criar um queijo Rochefort, mas de inspiração nacional? Ou ainda: que tal coletar algumas leveduras expontaneas para isso? Vou tentar, vamos ver no que vai resultar!

No meu próximo post falarei como estão as colônias, detalharei os estilos que escolhi e o andamento do trabalho.

Abraços a todos e uma ótima semana!

Cheese! Digo, Cheers!

Fontes

TECNOLOGIA DE FABRICAÇÃO DE QUEIJOS – Márcia Gonçlaves Dias
Nordic Recipe Archive
Produção de queijos gouda, gruyére, mussarela e prato – Fernanda de Morais Cavalcante

Fotos

Gruyére
Aquecimento do leite
Corte da coalhada
Coalhada dessorando
Forma de queijo redonda
Cura de queijos

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6 Responses to “Fabricação de queijos”

  1. wiliam oliveira
    July 21, 2011 at 20:35 #

    gostei muito deste post, geralmente vejo combinaçoes entre a cerveja e queijos, esse já propoe a criaçao do seu.
    já presenciei a fabricação de alguns tipos de queijos, tenho uma duvida na levedura, como retirar essa levedura? dos queijos que receberam a secagem ou cura por muito tempo.
    vlew um grande abraço, espero que continue postando topicos nem sempre comentados.

    como estou com o teclado meio ruim nao tem saido os acentos das palavras

    • July 21, 2011 at 21:11 #

      Opa, tudo certo, William?
      Então, minha tentativa foi buscar as olhaduras (bolhas internas do queijo) pois, aparentemente, haveriam mais colônias com maior possibilidade de biodisponibilidade. Agora vamos ver, né…
      O que coletei do Maasdam já coalhou, sinal de que já tem alguma coisa fermentando lá dentro.
      E, claro, há a possibilidade de adquirir as colônias, na forma liofilisado – igual fermento seco.
      No site da Etiel você encontra alguns tipos de colônias, vale a pena pesquisar pra ver se acha!
      Abraços e valeu pelo comentário!

  2. August 26, 2011 at 00:58 #

    Diogo,
    parabéns pelo post. Aliás, parabéns pelo blog. Já estou seguindo. Gostaria de mais detalhes de como fizeste para multiplicar as leveduras, o que é necessário e tal.

    • August 26, 2011 at 20:12 #

      Po, que massa você por aqui, Tarugo! :)
      Então, a tentativa de multiplicar as leveduras não foi muito produtiva… acho que a disponibilidade delas é baixa no queijo.

      Sugiro adquirir um pacote de leveduras mesmo, e fazer o queijo. Se quiser algo original, deixa ele maturando na sua casa aberto mesmo… deve ter alguns fungos legais no ar, e eles vão se multiplicar na casca do queijo, com certeza!

      Valeuzão, e grande abraço!

  3. August 26, 2011 at 20:52 #

    Ahhh, é tu Guga! Não reconheci o nome. hahahah
    Vou fazer uns queijos e te mostro. To pilhado em fazer ceva também. Valeu as dicas!

    abs

  4. August 19, 2011 at 20:52 #

    Boa tarde, Jairo!
    Então, estou pra escrever uma atualização para o post desde o final de semana.
    Ficou interessante, mas preciso ainda aperfeiçoar o processo. Vou comprar mais insumos e repetir as receitas, pra ver se consigo um resultado melhor!

    Esse final de semana dou as dicas!

    Att.

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